DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO | ATUALIDADES

 

O direito ao aborto, ou a liberação dele, é sempre um tema delicado. Aqui em nosso país ainda é um gigantesco tabu e poucos são os que querem debater o assunto, já alegando absolutamente que tal prática é criminosa e não deveria ser permitida.

Nosso país se encontra no grupo dos que aceitam o aborto apenas em casos específicos. Exceto em caso de gravidez resultante de estupro, da detecção de anencefalia fetal ou quando a prosseguimento da gestação coloca em risco a vida da mulher, o aborto no Brasil é considerado crime.

A prática está tipificada no crime de infanticídio está entre artigos 124 e 128 do código penal. Ou seja, mesmo resultando de uma medida desesperada e provocando traumas profundos, o aborto pode levar a mulher à cadeia.

Em nome de um conservadorismo vil e de um reacionarismo covarde, o Brasil está na contramão de países desenvolvidos ou com excelentes indicadores sociais. O Canadá, por exemplo, deixou de considerar crime o aborto em 1988. Ao contrário do que se imaginava, ou do que os reacionários querem pregar, a liberação não resultou em mais abortos.

Pelo contrário. A medida veio junto com avanços na saúde e na educação, promovendo amplo apoio ao planejamento familiar e estendendo fortemente a cobertura dos métodos contraceptivos. Além disso, o Canadá é um dos campeões em igualdade e promove bons serviços básicos a todos. O resultado é uma taxa de natalidade de 7 para cada mil meninas canadenses entre 15 e 19 anos e a ocorrência de apenas 31 em cada mil gestações não intencionais entre meninas na faixa dos 15 aos 49.

Aqui na América Latina, Cuba legalizou o aborto até a 10° semana de gestação em 1965. O país caribenho apresenta uma taxa de natalidade de 53 e de gestação não intencional de 72 para cada mil meninas entre 15 e 19 anos. Ao mesmo tempo, Cuba conta com uma cobertura contraceptiva de 69% para as mulheres com idade entre 15 e 49 anos, junto à baixíssima porcentagem de demanda por planejamento familiar não atendida, em apenas 8%.

Por toda a Europa o aborto é legalizado de alguma forma. Na maioria dos países a prática é irrestrita, necessitando, em alguns casos, do consentimento dos pais. Na Alemanha, a taxa de mortalidade materna é super baixa, de apenas 7 para 100 mil crianças nascidas vivas, o atendimento às demandas por planejamento familiar possui dados parecidos com os de Cuba e a gestão não intencional está em apenas 21 para cada mil meninas entre 15 e 19 anos.

Os países que legalizaram a prática do aborto e a complementaram com políticas de fortalecimento da educação sexual, planejamento familiar e difusão de métodos anticoncepcionais, assistiram à elevação de seus indicadores sociais. Programas como esses permitem que mais meninas concluam a educação básica, o que aumenta suas oportunidades no mercado de trabalho e possibilita uma renda maior, resultando em qualidade de vida e dignidade.

No Canadá, 88% dos estudantes estão matriculados no Ensino Médio em idade apropriada, Cuba tem uma taxa de 85%, idêntica a da Alemanha. Entre as mulheres, o Canadá apresentou expectativa de vida em 85 anos, Cuba 81 e Alemanha 84. Além disso, os três países possuem IDH em 0,936, 0,764 e 0,943, respectivamente.

Avanços parecidos podem ser verificados em outros países que legalizaram o aborto e deixaram de tratar o tema como um tabu sagrado e inviolável. É o caso do Uruguai, da África do Sul, Portugal, Espanha, Austrália e Nova Zelândia.

O Brasil, por sua vez, tinha em 2017 uma taxa de mortalidade materna de 60 para cada 100 mil crianças nascidas vivas e prevalência dos métodos contraceptivos em apenas 65% das mulheres entre 15 e 49 anos no ano de 2022. Além disso, nosso país possui uma proporção de gestações não intencionais de 67 para cada 1000 mulheres entre 15 e 49 anos no período de 2015 a 2019.

Condições como essas nos deixam muito abaixo nos indicadores sociais, comprometem toda uma geração de mulheres que, apesar de a prática ser criminalizada no Brasil, praticam o aborto. A diferença é que as mulheres mais endinheiradas, ou com o mínimo de capacidade financeira, fazem o procedimento de forma segura e eficaz. As mulheres pobres, por sua vez, em razão do desespero e da falta de perspectiva, recorrem a formas perigosas e improvisadas, o que resulta muitas vezes em morte.

É claro que a questão, hoje, não é se vamos liberar o aborto no Brasil. O que precisamos é começar a falar sobre o assunto, sem medo, e olhar para o tema não como caso de polícia, mas sim como problema de saúde pública. 

Fonte dos dados: UNFPA. Disponível em <https://brazil.unfpa.org/sites/default/files/pub-pdf/swop2022-ptbr-web.pdf>. Acesso em 22 set, 2023.

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