APOLOGIA DA HISTÓRIA - PARTE 07 | FICHAMENTO
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2.3 A TRANSMISSÃO DOS TESTEMUNHOS
“Reunir os documentos que estima necessários é uma das tarefas mais difíceis do historiador. De fato, ele não conseguiria realizá-la sem a ajuda de guias diversos: inventários de arquivos ou de bibliotecas, catálogos de museus, repertórios bibliográficos de toda sorte.” (p. 82)
O historiador não exerce um ofício autossuficiente. Em seu trabalho, ele depende daquilo que foi produzido por pesquisadores de outros campos. Sendo assim, reconstruir o passado é dispendioso em tempo e necessita de uma enorme quantidade de materiais, além que requer a constante atenção e valorização de suas ferramentas.
Os documentos que o historiador utiliza só serão úteis diante de sua plena consciência, já que os mesmos estão sujeitos à seleção dos pesquisadores ao longo do tempo e podem estar contaminados pelas inúmeras gerações por onde podem ter passado. Além disso, esses mesmos documentos precisam estar devidamente identificados nas obras historiográficas. Bloch afirmou que,
"Todo livro de história digno desse nome deveria comportar um capítulo ou [, caso se prefira], inserida nos pontos de inflexão da exposição, uma série de parágrafos que se intitulariam algo como: ‘Como posso saber o que vou lhes dizer?’ Estou convencido de que, ao tomar conhecimento dessas confissões, inclusive os leitores que não são do ofício experimentariam um verdadeiro prazer intelectual." (p. 83)
Para que seja produzida tal demanda aqui mencionada, cabe ao historiador reconhecer a desigualdade entre as fontes, distinguindo aquelas que são oficiais das cotidianas, compreender que determinados segmentos sociais possuem documentos melhores preservados e que outros têm seus registros tardiamente produzidos.
O estudo dos documentos requer do historiador o conhecimento do contexto em que eles foram produzidos e da sociedade da qual eles fizeram parte. É preciso levar em consideração, também, os lugares por onde os documentos estiveram e compreender a possibilidade de preservação seletiva no curso de sua existência. Para exemplificar, Bloch escreveu que
"O papel desempenhado pelos confiscos revolucionários [...] é o de uma deidade não raro propícia ao pesquisador: a catástrofe. Incontáveis municípios romanos se transformaram em banais cidadezinhas italianas, onde o arqueólogo descobre alguns vestígios da Antiguidade; foi só a erupção do Vesúvio que preservou Pompeia." (p. 84)
Percebemos, então, que os testemunhos raramente são preservados, estando eles sujeitos aos desastres naturais, à destruição durante uma guerra e ao escape daquilo que foi produzido pelos menos favorecidos. A calmaria, no entanto, não significa a transmissão facilitada dos testemunhos. Muitas vezes, é justamente a ebulição de um processo revolucionário quem expõe aquilo que estava escondido e que recupera o que não foi destruído a tempo por aqueles que querem omitir. O autor escreveu sobre isso:
"Se a comunidade dos monges dionisianos tivesse sobrevivido à Revolução [Francesa], seria certo que nos permitiram vasculhar seus cofres? Tampouco, talvez, a Companhia de Jesus abrisse ao profano o acesso a seus acervos, [...] ou o banco da França convidasse os especialistas em Primeiro Império a consultar seus registros. [...] Eis onde o historiador do presente fica em desvantagem: fica quase totalmente privado dessas confidências involuntárias." (p. 85)
O historiador do presente, como Bloch chamou a atenção, se vê dependente da entrega voluntária de documentos, que quase sempre são selecionados por sua fonte. Ele então é vítima do sigilo, que esconde do historiador o passado e o presente, omite estatísticas, dissimula os fatos, prejudicando a produção de um trabalho que serviria à toda a sociedade.
Logo, o acesso ou não aos testemunhos tem origem nas forças históricas e depende da preservação dos vestígios, escritos ou não. Tal condição obriga o historiador a trabalhar com a causalidade, limitando-se, muitas vezes, ao previsível. Mesmo assim,
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